Novidade

Brevemente, além de leres poderás ouvir os meus poemas e prosas recitados por mim e com fundo musical.

quinta-feira, 31 de agosto de 2017

FAMÍLIA (inspirado na música de Rui Massena)

Somos a semente sem vontade própria,
plantada num ventre que nos dá guarida,
Embrião de um ser fruto do sexo,
Princípio de algo tão nobre e complexo,
no pressuposto da continuidade da vida.

Seremos porventura um sonho desejado,
Num gesto de paixão numa noite de amor.
Ou seremos apenas resultado do acaso,
aventura banal inconsciente dum caso,
em que o prazer se sobrepôs à dor?

Chegamos ao mundo que parece perfeito,
Deixando a protecção do ventre materno.
Sem consciência sequer donde estamos,
o que somos, para onde vamos,
porque tudo parece ser bom e eterno.

Não nos foi dado nunca a escolher,
o pai ou a mãe da nossa concepção.
Esperamos a sorte que vai ditar,
Se esses realmente nos vão amar,
ou se nos atiram ao mundo sem protecção.

Duma forma ou doutra nos vamos criando,
Nessa família que inventaram para nós...
A partir do momento em que somos gente,
os pais, esses nós temos certamente,
e talvez irmãos, primos, tios e avós....

Com sorte, cresceremos então nesse meio,
aí fundaremos as nossas raízes...
Com mais sorte ainda seremos amados,
Seremos protegidos e educados,
o conceito definido de crianças felizes.

Outros porém, talvez menos afortunados,
Vivem bem cedo o sabor da desilusão.
Crescem nas pedras dum qualquer asfalto,
Vivem  dia a dia num sobressalto,
Sob o tecto de uma qualquer instituição.

Quem conforta o seu choro o seu pranto?
Quem lhes dá colo, ternura, calor?
São gente, que não querendo nada,
são uma família emprestada,
Verdadeiros profissionais do amor.

Uns e outros seguimos os caminhos,
que as escolhas e o destino nos dão...
Bem sucedidos, ou mal educados,
Seremos fruto donde fomos criados,
salvaguardando sempre a excepção.

Nesse percurso outros tantos ao nosso lado
partilham pedaços do nosso crescimento.
Alguns, poucos, de uma forma marcante,
serão sempre uma presença constante,
quer no bom ou mau momento.

Esses que sempre nos ouvem, nos apoiam,
nos dão força, paciência e até amparo....
São uma outra familia escolhida,
porque naquela que nos deu vida,
é um gesto cada vez mais raro.

Tal como começamos, também acabamos,
a precisar de quem nos possa cuidar.
Com a tal sorte, na família onde nascemos,
mas o mais certo que nós temos,
é sozinhos ou num qualquer lar.

E de novo contamos com alguém,
que nada nos é, que nada nos diz....
Contudo, são os seus gestos de empenho,
nesse ser, que para nós é estranho,
mas nos ajuda a ter um final mais feliz.

O que é então essa tal família?
Os filhos? os pais? os avós?
Ou serão aqueles que mais amamos,
com os quais nossa vida partilhamos,
e que sem nos julgar nos amam a nós?

A família é um mero e abstracto conceito,
da procriação nesta egoísta sociedade.
Familia, é quem vive no nosso peito,
Os que nos preenchem de algum jeito,
são a nossa família de verdade.




quarta-feira, 30 de agosto de 2017

ESTRADA (inspirado na musica de Rui Massena)

Mais uma vez aqui estou, sozinho....
Percorri trilhos, caí,
levantei-me, segui,
o instinto me levou no seu caminho....
Como ave peregrina
que pousa breve e cansada,
Julguei voar pelo mundo,
onde tive tudo,
onde fiquei sem nada....
Lambi as feridas,
Escondi o medo,
Continuei a sorrir,
Cantei,
baixinho,
em segredo...
A solidão me aconchegou
na noite fria....
A alma esqueceu o que sou,
de tão triste e vazia....
Sacudi as asas....
Queria ainda voar...
Porque até as lágrimas,
já estavam secas de tanto chorar...
Perdi as utopias de menino,
quase me perdi de mim,
Fui levado pelo destino,
fui ao acaso,
no cansaço,
tropecei no atalho
mas olhei sempre o fim....
A custo me reergui...
Tantas vezes me reinventei....
Olhando em frente,
acreditei....
O importante é seguir....
Nunca, nunca desistir....
E de braços abertos
o amanhã abracei.
Corri à chuva e ao vento,
soltei as amarras do pensamento,
Porque queria ser feliz....
O passado...
è apenas, uma cicatriz.
Já lá vai o Inverno,
Vem de novo a Primavera,
Talvez, eu tenha ainda,
um sol à minha espera...
E no meu grito em silêncio,
ecoando no meu peito,
despertei na madrugada
e ao abrir os meus olhos
vi a luz de um novo sonho
que me iluminava de vida,
Que me sarava a ferida,
E minha alma, então renovada,
ergueu meu corpo,
e confiante,
seguiu uma nova estrada.

quinta-feira, 24 de agosto de 2017

EXTROSPECÇÃO


Despertas cedo, de um sono mal dormido,
de sonhos inacabados, episódios soltos,
porque o corpo cansado e ferido,
não deixa a mente repousar....
Descansa apenas o corpo prostrado de cansaço,
envolto nos lençóis, como um abraço,
onde te procuras aconchegar...
É manhã! O sol testemunha o dia.
Qual autómato sem energia,
preparas-te para sair.
O espelho já mal te vê...
Tem saudades do teu olhar....
Ouve apenas o fechar da porta,
o que ali fica, pouco importa,
estará tudo igual ao voltar.
Há quem lhe chame casa,
Há quem lhe chame lar...
no fundo, um local para pernoitar.
Fica o silêncio, do vazio,
e segues então o teu trilho,
tal como seguro segue o rio,
que corre pelo seu leito,
sabendo que algures, irá encontrar o mar.
É fácil. Tão fácil !
Vais em piloto automático,
para onde o hábito te levar.
E o painel de controlo indica..
Hora de trabalhar!
E então cumpres, meticulosamente,
aquela que é a tua missão...
Porque afinal, gastaste anos de luta,
empenho e desgaste,
até que alcançaste,
o teu sonho, tua paixão.
Mas será que já percebeste
tudo o resto que perdeste
nessa tua obsessão?
Nem há tempo para pensar...
Conseguiste, de alguma maneira,
uma condição financeira,
que te faz continuar...
Assim, podes ter tudo...
ou pelo menos tudo aquilo,
que o dinheiro pode comprar....
Segues. Firme. Constróis o teu império.
Não desvias o olhar, e o pragmatismo
é constante nessa tua dedicação.
Mas o tempo passa, os anos cansam,
o corpo mais velho e cansado,
já se pergunta a si mesmo
se no peito ainda bate um coração....
A juventude apagou-se....
Cansada, desgastada, ficou para trás...
Agora, és só um corpo, que quer paz...
E quando menos esperas, cais !
O corpo não aguenta mais!
Só então páras! Na obrigação de parar!
E finalmente te dás ao soberbo luxo,
de reflectir, de pensar:
- O que fiz de mim? Quem sou eu?
Gastei metade da minha vida,
lutando pelo que queria ter,
e nem sei se na outra metade,
serei o que queria ser....
Onde estão meus amigos?
Com quem não ri, com quem não conversei....
Os filmes que não vi, os livros que não li,
as viagens que não fiz, as pessoas que não amei....
A família? Os filhos? A continuação de mim?
Foi só para ter que cá vim?
Mas ter dá-me poder, não me enche a alma,
não me acaricia, não me acalma,
não me faz rir, não me faz sentir...
Nem sequer me faz chorar...
Tanto empenho, tanta luta, e afinal....
resta-me o silêncio branco e puro
das horas infinitas duma cama de hospital....
........
Agradece o momento...
Estás com o teu pensamento
Finalmente, paraste, tiveste tempo para pensar.
Há sempre um tempo necessário
para olhar para trás...
Perceber, entender, e.... mudar!
Que não seja tarde demais!
A vida está à tua espera!
O sol, lá fora, continua a brilhar,
tu é que não o vias na tua pressa ao passar...
Ainda é tempo! É sempre tempo!
Uma vida tem muitas vidas,
uma história tem vários episódios,
e tu, estás em constante construção.
A dor, o sofrimento, faz parte do processo.
Tudo é em nós constante mutação.
Apenas controlas uma parte do teu destino,
Nas escolhas que fazes, nos caminhos que segues...
E as derrotas... dão mais sabor ao que consegues.
Nem tudo é fácil, nem tudo é riso,
e é até mesmo preciso
saber por vezes chorar...
Sentir das lágrimas o seu salgado sabor...
para valorizar o contraste
de um doce e terno momento de amor.
És o que és, não o que tens!
A vida quer-te! O mundo gosta de ti!
Tens um tempo, que é só teu!
Fazes dele o que quiseres....
Não vivas em utopia.
Um bom momento, faz feliz um dia....
Um bom dia pode valer por um ano...
Pode parecer até insano,
mas não existe felicidade completa.
Existe apenas uma meta,
onde todos iremos chegar,
e aí, será o somatório dos momentos felizes,
que mais vai importar.
Abre os olhos, desperta.
Ao teu lado, perto e junto a ti,
sempre esteve o que nunca quiseste ver.
Pequenos nadas que tanto podem valer.
Uma mão estendida, alguém para te ouvir,
uns braços algures abertos
ansiosos por te abraçar.
Um beijo suave no rosto
de quem te quer apenas e tão somente amar.
Há um jardim á tua porta,
que ainda não viste a florir...
Há uma boca, no teu rosto,
desejosa de sorrir.
O relógio não para, nunca parou...
Conta incansavelmente todos e cada segundo
desde o feliz momento em que vieste a este mundo,
até ao ultimo suspiro de uma descansada morte.
Mas nas mãos, tens parte da tua sorte.
Do que por ti quiseres fazer.
Por isso acorda! Vai. Vai viver!
....
Final do dia, de volta a casa.
A chave roda na fechadura,
como se abrisse a porta da vida.
A luz esvanecida, de um sol meio escondido,
entra ainda pela janela, curioso por te ver voltar.
E tu, abres a janela, para deixá-lo entrar...
A brisa afaga-te o rosto,
como caricia alegre de te ver chegar.
Há um todo que te rodeia,
que ganha vida e cor
como se as paredes da casa fossem pintadas de amor,
e tu, de braços abertos, num esfusiante rodopiar,
gritas cortando o silêncio,
-este é o meu mundo, o meu lar.
Páras de frente ao tal espelho...
Ah, como ele gosta de te ver!
Há tanto que te andavas a esconder.
O teu olhar já tem sonho, tem vida,
o rosto parece brilhar.
Estava afinal em ti mesmo,
a essência dessa mudança,
mas os valores trocados,
e os princípios ofuscados,
tinham adormecido a esperança.
Agora sim. Já te podes deitar.
Os lençóis esperam sedentos,
para te envolver em carinho....
O sono aproxima-se calmo,
na certeza que sabes o teu caminho.
Tens-te a ti! Tens o mundo!
Tens nas mão a tua vida!
Tens em ti a tua verdadeira essência!
E adormeces...
na tranquilidade da tua consciência,
sabendo que te espera
outra radiante manhã,
na certeza consciente de não quereres,
uma vida fútil e vã.